A interseção arte, psicologia, psiquiatria e psicanálise como foco de interesse de pesquisadores tem início no final do século XIX com Simon (1876 e 1888), Lambroso (1889) e maior repercussão no séc. XX com os trabalhos de Tardieu (1972); Mohr (1906) e Prinzhorn (1922).
Como campo específico do conhecimento, a arteterapia firma-se nos Estados Unidos da América, em
1940, com o trabalho de Margareth Nauberg, influenciada pela psicanálise freudiana, estabeleceu as fundamentações teóricas da Arteterapia, além de demarca-la como área do saber.
"O processo de arteterapia se baseia no reconhecimento de que os pensamentos
e os sentimentos mais fundamentais do homem, derivados do inconsciente,
encontram sua expressão em imagens e não em palavras"
(Naumburg, 1991, p.388 citado por Vasconcelos e Giglio, 2007).
Sigmund Freud observou que o artista pode simbolizar concretamente o inconsciente em sua produção, retratando conteúdos do psiquismo. Acerca disso, no quadro de Leonardo denominado “A Sant’Ana, Virgem e o Menino”, Freud observou uma síntese da história da infância do artista. A relação com as duas mães que
aparecem em seus quadros, tanto no do Louvre quanto no desenho de Londres, com um
corpo duplo e uma mistura de pernas, Leonardo pode ter imaginado que
aconteceu com sua mãe o mesmo que com a Virgem Maria, mãe do Menino Jesus, representando duas mulheres, que na análise de Freud, seria sua avó com aparência jovem junto a sua mãe que
também teve um filho sem pai, e, portanto, sem a relação sexual e sem a castração (Santos, 2012).
A mistura de pernas é algo que se repete também no
seu desenho sobre a relação sexual, assim como se repete
em muitos quadros a aparência andrógina de suas figuras,
mostrando que Leonardo tentou fundir o masculino e o
feminino numa mesma figura.
"As técnicas da arteterapia se baseiam no conhecimento de que cada indivíduo, treinado ou não em arte, tem uma capacidade latente de projetarseus conflitos internos em forma visual. Quando os pacientes visualizam tais experiências internas, ocorre freqüentemente que eles se tornam mais articulados verbalmente "(Naumburg, 1991, p.388 citado por Vasconcelos e Giglio, 2007).
Sob a perspectiva da Psicologia Analítica, os estudos de Jung influenciaram amplamente o campo da arteterapia, trazendo à tona discussões mais profundas em torno da importância do mundo imagético na compreensão do psiquismo e, conseqüentemente, valorizando a análise das imagens simbólicas projetadas nas produções artísticas dos pacientes dentro do enquadre psicoterapêutico.
Segundo Jung, o princípio originário que rege a natureza humana é o mundo das imagens e, portanto,
toda experiência humana tem seu desdobramento a partir dessa premissa. Ele atribui à imagem arquetípica - que também foi nomeada como imagem primordial (manifestação de ordem coletiva e de características mitológicas) - tem papel fundamental na constituição de todos os processos mentais, considerando que aí se configuram as vivências primordiais da humanidade (Kugler, 2002 citado por Vasconcellos e Giglio, 2007).
Os arquétipos - “elementos estruturais numinosos” que dão a fôrma para que conteúdos do consciente se moldem e, assim, possam tornar-se perceptíveis - são os centros energéticos que poderão ser constelados ao emergir na forma de símbolos. O símbolo também agrega função terapêutica que não se restringe à imagem em si, contemplando o significado que transcende a própria imagem (Tommasi, 2003 citado por Vasconcellos e Giglio, 2007).
“[...] nunca se pode encontrar o arquétipo em si de maneira direta, mas apenas
indiretamente, quando se manifesta no símbolo ou no sintoma ou no complexo”
(Jacobi, 1995, p.73).
Jung define o fenômeno imagético como “uma expressão concentrada da situação psíquica como um todo”, distinguindo-o de qualquer manifestação patológica (onde costuma ocorrer distorção da realidade), sendo um processo interno. A expressão imagética, portanto, agrega apenas conteúdos do inconsciente constelados naquele momento, visto que a seleção dos conteúdos relevantes e irrelevantes à formação da imagem é um processo consciente (Vasconcellos e Giglio, 2007).
A finalidade do ‘método de expressão’ com elementos pictóricos é tornar os conteúdos inconscientes acessíveis e, assim, aproximá-los da compreensão. Portanto, tanto a produção de um artista ou de um paciente inserido em um ambiente psicoterapêutico, a imagem que se revela durante o processo terapêutico, são aspectos da psique do sujeito constelados naquele específico momento (Giglio, 1992; Zimmermann, 1992).
Ao fazermos a leitura de um símbolo, procuramos auxiliar o sujeito a decifrar a realidade invisível que se oculta através do que nos é perceptível no ambiente terapêutico. ¨No entanto, mesmo sendo interpretado, os significados nele implícitos nunca se esgotam, pois quando seu significado é completamente decifrado, ocorre a morte do símbolo¨ (Kast, 1997a citado por Vasconcellos e Giglio, 2007).
Com essa terapêutica consegue-se impedir a perigosa cisão entre a consciência e os processos inconscientes. Todos os processos e efeitos de profundidade psíquica, representados pictoricamente, são, em oposição à representação objetiva ou ‘consciente’, simbólicos, quer dizer, indicam da melhor maneira possível, e de forma aproximada, um sentido que, por enquanto, ainda é desconhecido (Jung, 1935/1985, p.120)".
A partir dos estudos de Silveira (1992), as imagens internas são subjetivas por retratarem a realidade psíquica em sua amplitude (consciente e inconsciente pessoal), mas podem ser universais, pois muitas vezes apresentam motivos arquetípicos compartilhados com toda a humanidade (inconsciente coletivo) (Vasconcellos e Giglio, 2007).
Outra autora que estudou os aspectos terapêuticos do ato de pintar e desenhar foi Zimmermann (1992). Ela destacou que neste processo terapêutico ocorre a canalização da energia contida por meio da catarse, podendo desencadear a redistribuição da energia psíquica durante a elaboração artística, mencionando a oportunidade de oferecimento de espaço continente às projeções de conteúdos inconscientes durante o processo expressivo, discutindo também a questão da análise e interpretação das produções dos pacientes (Vasconcellos e Giglio, 2007)
Por fim, o que se deseja dizer é que a expressão livre por meio da linguagem gráfica e pictórica (pela via das artes plásticas) vem sendo reconhecida pelos profissionais da área da saúde pelas suas potencialidades terapêuticas.